Tecnologia e Sociedade: a máquina a vapor*

Sergio Augusto de Moraes
Novembro/2017
                
Quem inventou a máquina a vapor? Qualquer engenheiro ou um estudante mais curioso responderia de pronto que foi James Watt na Inglaterra, aí pela segunda metade do século XVIII. Entretanto poucos sabem que Watt, ao projetar e construir um condensador em separado no ano de 1765, estava contribuindo para dar um salto no rendimento das máquinas a vapor que alguns anos antes haviam sido desenvolvidas por outros técnicos.
De fato em 1698 Thomas Savery, também na Inglaterra, constrói sua “máquina de fogo” e poucos anos depois se associa a Thomas Newcomen para construir uma máquina a vapor capaz de retirar água das minas inglesas de carvão e de estanho. A partir daí Watt deu o pulo e construiu a máquina que iria marcar a primeira revolução industrial.
Mas o que intriga é saber que, mais provavelmente entre os anos 10 e 70 DC, Heron de Alexandria havia construído uma máquina a vapor que continha quase todos os elementos da máquina que Thomas Savery iria construir dezesseis séculos depois. Porque a humanidade deveria esperar todo esse tempo para retomar o desenvolvimento tecnológico de uma máquina capaz de potenciar o trabalho humano de maneira tão radical? 
Claro, faltavam uns poucos conhecimentos básicos para aperfeiçoar a máquina de Heron tornando-a mais eficiente. Provavelmente ele ainda não conhecia o valor da pressão atmosférica, número identificado por Torricelli em 1644. Mas quem pode garantir que os discípulos de Heron, com os recursos do império romano, não poderiam desenvolver e tornar eficiente a turbina a vapor que o grande sábio havia construído?
Como sempre, quando se tenta entender a história antiga, aparecem lacunas que não podemos ainda explicar. Entretanto uma coisa é certa: o império romano havia sido construído com base no trabalho escravo e a sua maneira de potenciar o trabalho humano era conquistar novos povos e escravizá-los. Não podia passar pela cabeça dos poderosos que dirigiam Roma o desenvolvimento de uma máquina que dispensasse o trabalho escravo. Seria como chutar contra seu próprio gol.
Assim, foram as relações sociais sobre as quais se assentava aquela sociedade a mais forte razão que impediu o desenvolvimento da máquina a vapor de Heron. E o preço que a humanidade pagou por isso foi incomensurável.
Pergunta que não quer calar: que consequências teve o freio imposto pelas velhas relações de produção na Russia sobre o desenvolvimento da revolução de 1917?
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(*) primeira versão publicada no Jornal do Clube de Engenharia nº 506. Texto revisto e ampliado em Outubro de 2017.  

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