Por detrás da crise palaciana


Alfredo Maciel da Silveira
Sergio Augusto de Moraes
Fevereiro - 2019
Assistiu-se a um lento processo de exoneração de Gustavo Bebianno, então Ministro da Secretaria-Geral da Presidência. A forma tumultuada, com troca agressiva de palavras e acusações entre o Ministro e o Presidente, sob a ostensiva interveniência de um dos filhos deste, o Carlos “Pit-bull”, mediante canais de comunicação informais deliberadamente vazados ao público, levou a que se suspeitasse de motivações veladas, por detrás das aparências.
Do que circulou na imprensa, vindo de jornalistas da área política próximos aos acontecimentos, três hipóteses explicativas distintas e independentes se destacaram. Pode-se afirmar todavia que as mesmas não se excluem mutuamente, e bem podem ser somadas, tendo ficado claro que Bebianno tornara-se mesmo uma “pedra no sapato” do clã Bolsonaro.
Ei-las em resumo:
1) O enfrentamento público por Bebianno, do controle por milicianos do Hospital Federal de Bonsucesso, poderia ser mais um fio da meada que levaria das milícias ao clã Bolsonaro;
2) Disputa de verbas públicas para as eleições de 2020, agora que o PSL “engordou”, e onde o projeto de poder do clã esbarra nos interesses liderados por Bebianno no PSL;
3) Manobra diversionista em acusar Bebianno de “traidor”, pra desviar a atenção do respingo da investigação de candidatos “laranja” do PSL sobre a campanha eleitoral do próprio Presidente.
Além disto Bebiano tinha se transformado em um amigo do bloco de Generais do Governo e estabelecido boas relações com o Presidente da Câmara Rodrigo Maia por cima do líder do PSL naquela casa. Começava então a ficar “imexível”.
Isto incomodava fortemente Carlos “Pit-Bull” por causa de uma velha disputa entre ele e Bebiano sobre o controle da mídia da campanha eleitoral; aproveitando-se de uma situação privilegiada , visto ser um dos únicos a ficar ao lado de seu pai durante a internação hospitalar do mesmo, armou uma cilada para Bebianno em torno de uma questão menor e levou seu pai a acusar Bebianno de mentiroso nas redes sociais. Os áudios divulgados um dia após a exoneração mostram que tal acusação não tinha base real.
Nestes áudios há que destacar a assustadora referência do Presidente ao Grupo Globo como “inimigo” a propósito de exigir o cancelamento de encontro agendado, institucional e público, de representante daquele grupo empresarial com o então Ministro Bebianno. “Inimigo não entra no Palácio!”
Várias reações se sucederam, desde o próprio Grupo Globo até o Congresso Nacional, apontando o caráter de ameaça às instituições democráticas contido naquele juízo do Presidente quanto ao papel de uma organização dos meios de comunicação.
Sucede que esse tratamento dispensado à grande imprensa como “inimiga”, pode não ser apenas destempero verbal momentâneo do Presidente pois é a linguagem que corre agora nas redes sociais bolsonaristas, em pé de guerra contra todas as grandes organizações da imprensa. É linguagem que difunde um modo autoritário e odioso de ver a política, irradiado desde toda a carreira política do atual Presidente, movida pelo fígado e não pela cabeça. A assim continuar configura-se um risco para a República e a Democracia.
Por isso não devem ter sido gratuitas ou descoordenadas as enfáticas declarações dos chefes militares ao longo de janeiro, nas passagens de comando das três forças e também na posse do Ministro da Defesa, enaltecendo e valorizando o papel da imprensa livre no fortalecimento das instituições democráticas.
Será preciso aos democratas tirarem todos os ensinamentos deste triste episódio de crise palaciana, não deixando que se ocultem as obscuras razões abaixo da superfície dos acontecimentos, criticando-as duramente, alertando a sociedade para procedimentos que ameaçam a democracia.