Para salvar a democracia

Sergio Augusto de Moraes
Alfredo Maciel da Silveira
Outubro-2018
Já no dia seguinte ao 1º turno das eleições publicamos aqui no Blog, sob o título “Pela Democracia” o chamamento por uma Frente Democrática em defesa da democracia que os brasileiros amplamente desejam mas que se encontra ameaçada. Dizíamos:
"Para garanti-la a alternativa seria Haddad propor um “Pacto pela democracia” e um governo de “Frente democrática”, com a participação de outras forças e partidos democráticos e um programa mínimo de respeitar a Constituição de 88, garantir o prosseguimento da Lava-Jato, manter o equilíbrio fiscal, incorporar uma atitude republicana na relação com os outros poderes e incluir as principais medidas sociais e econômicas do primeiro Governo Lula".
Democratas de vários quadrantes ainda resistem à proposta, não se dando conta da força que aquele pacto teria entre as forças democráticas, no limite conquistando até mesmo eleitores democráticos que correram para Bolsonaro no 1º turno com medo da “volta do PT”. Desta forma a candidatura Haddad já não  seria apenas do PT mas de uma amplíssima Frente que expressaria os verdadeiros anseios democráticos da maioria do povo brasileiro.
Dadas suas dificuldades, já que tal iniciativa deveria caber a Haddad, tal proposta suscita ceticismo e mesmo ganha adversários; mas, como é a alternativa mais viável para evitar a vitória da direita golpista ela ganha corpo. Logo em seguida no dia 11, o diplomata Rubens Ricupero, ex-embaixador do Brasil em Washington (1991-1993) e Roma (1995); ex-ministro do Meio Ambiente e da Fazenda (1993-1994 e 1994, governo Itamar) publicara na Folha de São Paulo artigo em defesa da Frente Democrática aprofundando as suas razões nesta hora decisiva para a democracia no Brasil. Se para Haddad e o PT a democracia vale mais que seus interesses partidários Ricupero será considerado.
Segue o artigo de Ricupero.
Rubens Ricupero - Foto de Marlene Bergamo - 2017

O Dever dos Neutros
É preciso lutar por uma Frente democrática

"Entre os que destroem a lei e os que a observam não há neutralidade admissível". Rui Barbosa (1849-1923) pronunciou essas palavras em Buenos Aires (1916) no contexto da Primeira Guerra Mundial. Neutralidade, explicava, "não quer dizer impassibilidade: quer dizer imparcialidade; e não há imparcialidade entre o direito e a injustiça".
A clareza da distinção pode ajudar-nos a enfrentar o dilema eleitoral na definição do dicionário: situação embaraçosa com duas saídas difíceis ou penosas. Vejamos em concreto se há diferença entre essas saídas.
Não há lugar, creio, para imparcialidade entre quem quer retirar o Brasil do Acordo de Paris sobre clima e quem deseja honrá-lo. Tampouco sou imparcial entre quem defende a proteção dos ecossistemas tal como prescrito na lei e os que atacam suposta indústria de multas do Ibama contra desmatadores ilegais.
Os mesmos que tencionam suprimir o Ministério do Meio Ambiente e subordiná-lo ao da Agricultura em ótica meramente produtivista, sem olhar as consequências de devastação ambiental e da concentração de renda.
Entre os defensores da Constituição, da democracia liberal, da tolerância, da diversidade, da civilidade na vida política e seus detratores, escolho sem hesitar os primeiros. Coloco-me ao lado dos promotores dos direitos humanos, da prioridade de combater a desigualdade, suprimir a miséria; sou contra os críticos de tais posições.
Prefiro diplomacia que preserve o papel construtivo do Brasil como fator de moderação e equilíbrio no continente e no mundo aos que advogam atitudes que nos isolariam da maioria da humanidade.
Um exemplo é a intenção de Bolsonaro de transferir a Jerusalém nossa embaixada em Israel na ausência de acordo com todos os interessados. Isso nos relegaria a situação ridícula, abaixo do Paraguai, que teve o bom senso de recuar dessa tresloucada ideia.
Entre valores e contravalores não tenho o direito de ser neutro. Darei meu voto ao candidato que encarnar valores absolutos e inegociáveis como os mencionados acima.
Dito isso, penso que o dever dos neutros é ir além do voto e lutar por uma frente democrática que una o mais amplo espectro de opinião possível.
Concordo com os pontos levantados por Celso Rocha de Barros no artigo publicado por esta Folha na última segunda-feira dia 8. Por definição, uma aliança não deve refletir hegemonia de nenhum partido. Tem de acolher a exigência popular de combate à corrupção, ajuste fiscal, responsabilidade no uso de recursos escassos --o que falta no programa do PT, além da autocrítica.
Não se vai ganhar só com o PT e a esquerda. Reconhecer esse fato obriga a ter um programa de mínimo denominador comum que conquiste os moderados.
E, no caso de difícil vitória, dê garantia a todos de que se terá um governo não sectário, pacificador e unificador da sociedade brasileira. 
Rubens Ricupero