Na luta contra a ditadura de
1964 muitos sofreram as piores dores e até deram sua vida para
restabelecer a democracia. Agora, de maneira solerte, querem nos subtrair esta
conquista. Diga não à manifestação do dia 15/03.
Veja abaixo o porquê.
Veja abaixo o porquê.
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Com fórmula 'Povo e Exército', Bolsonaro inspira-se no chavismo para ensaiar ruptura institucional
Demétrio Magnoli*
29 de Fevereiro - 2020
Engana-se quem interpretou
a militarização do núcleo político do governo como sinal de marginalização dos
extremistas do bolsonaro-olavismo. Depois de recolher suas bravatas vazias
contra a ditadura de Maduro, Jair Bolsonaro inspira-se no chavismo para ensaiar
uma ruptura institucional. “O Povo e o Exército” — a fórmula chavista orienta
os dois motins paralelos estimulados pelo presidente contra a democracia. A
estratégia avança à sombra do temor dos líderes parlamentares e dos comandantes
militares, que se curvam diante do espectro disforme das redes sociais.
Demétrio Magnoli |
A letra da lei não assusta os
arruaceiros que copiam os métodos das facções. Quando Cid Gomes avançou, irresponsavelmente, com uma escavadeira, exprimia uma justa
indignação. Aceitaremos, de braços cruzados, a transmutação da PM em milícia
politizada? Sim, claro, respondeu Sergio Moro: “o governo federal veio para
serenar os ânimos, não para acirrar”.
No lugar de cercar os quartéis
invadidos, cortar luz e água, exigir a rendição dos amotinados, as forças
federais limitaram-se a substituir a polícia no patrulhamento das ruas,
oferecendo aos bandidos em uniforme um tempo extra para o exercício da chantagem.
“Serenar os ânimos”: o governo estadual, desarmado, deve enfrentar sozinho os
milicianos armados. A novela ruma às conclusões previsíveis: negociação e, lá
adiante, anistia. O crime compensa.
O 15 de março nasceu
da divisão no entorno militar de Bolsonaro. A adesão de Augusto Heleno ao extremismo abriu caminho para a convocação de
marchas contra o Congresso, que têm o respaldo explícito do presidente. Não se
trata, ainda, de consumar a ruptura, mas de testar a espinha dorsal das
instituições democráticas. A meta é acuar, intimidar. Os alvos explícitos são
os parlamentares e o STF. Mas, paralelamente, investe-se na agitação da
oficialidade: o Povo e o Exército.
As declarações evasivas de Hamilton Mourão evidenciam uma rendição. Protestos
contra o Congresso certamente “fazem parte da democracia”, mas não uma
convocação a eles oriunda do chefe do Executivo. Os paralelos apropriados são
com a “marcha sobre Roma” de Mussolini ou os cercos à Assembleia Nacional
promovidos por Maduro. Celso de Mello foi ao ponto quando disse que Bolsonaro "desconhece o valor da ordem constitucional" e,
portanto, “não está à altura do cargo que exerce”.
No início, o cordão de generais
do Planalto definia limites à retórica presidencial. Desde a demissão de Santos
Cruz e o bombardeio virtual contra Mourão, os homens estrelados baixaram a
cabeça. Como no caso das PMs, as redes extremistas engajam-se na cooptação de
oficiais da ativa de escalão intermediário, ameaçando a disciplina militar.
Santos Cruz tem razão ao alertar para o risco de “confundir o Exército com assuntos temporários
de governo, partidos políticos e pessoas”.
Bolsonaro imagina que é capaz
de mobilizar incontáveis milhões pois enxerga nas suas redes sociais a imagem
do Povo. Os líderes do Congresso e os comandos das Forças Armadas compartilham
a ilusão presidencial. Daí, o temor geral de pronunciar a palavra “Basta!”.
Os chefes militares renunciam a
prestar continência à Constituição e repelir a politização dos quartéis. Os
políticos vacilam diante do imperativo de deflagrar um processo de impeachment.
A opção pelo apaziguamento encorajará os extremistas a avançar mais um passo,
testando uma nova fronteira. Às vezes, as democracias morrem de uma enfermidade
chamada medo.
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(*) Sociólogo, é doutor em
geografia humana pela USP. Publicado originariamente na Folha de São Paulo,
29-02-2020