Carnaval e política

Sergio Augusto de Moraes
Fevereiro de 2018

De alguns anos para cá o fenômeno já despontava: nos blocos de rua milhões de cariocas, paulistanos, soteropolitanos, recifenses e cidadãos de centenas de outras cidade brasileiras dançam e pulam durante três dias ( no mínimo) ao som das mais diversas músicas, do samba ao funk, em boa parte recheados de críticas às autoridades, aos políticos, às mazelas do Brasil . Mesmo no Rio , com a ameaça da violência e as ausências do Prefeito e do Governador, o povo caiu na folia criticando em particular o Prefeito que havia fugido para a Europa com despesas pagas com nosso dinheiro.

Se nos anos anteriores já despontava em muitos destes blocos alguma crítica política, em 2018 a coisa ganhou outra dimensão. Esta atitude foi generalizada. Algo novo no Brasil.

E não foi só nos blocos , algo mais natural tendo em vista sua independência das autoridades. As grandes escolas de samba também entraram nesta dança, a começar pela Beija- Flor de Nilópolis, campeã do Carnaval Carioca.

Em entrevista dada à revista online “Carnavalesco”, Jack Vasconcelos, responsável pelo bom desfile da Paraíso de Tuiuti, explicou por quê:


“Eu acho que é positivo a gente poder se posicionar. Muito disso tem relação com a troca de governo. Hoje somos oposição e antes éramos parceiros do poder e não podíamos arranhar a relação. Enredos mais críticos não eram incentivados. Agora com uma guerra declarada tem essa abertura maior. Os dirigentes nos deixam livres, e temos mais é que fazer”.

Mesmo com alguns fatos violentos, inaceitáveis , em geral puxados pelos vândalos de sempre, parece que o povo na rua estabeleceu uma outra ordem na cidade. Não a ordem das armas e do temor, a ordem da alegria coletiva. As pessoas caminhavam mais tranquilas , crianças participavam da festa, jovens varavam a noite sem medo dos bandidos. Para a dimensão do evento, com um policiamento pífio, quem estabeleceu a ordem foi a multidão. Uma contribuição à democracia.

Parece que foi um ensaio para Outubro de 2018. Os candidatos que se preparem.

Basta um dia - Clara Nunes

...É só
O que eu pedia
Um dia pra aplacar
Minha agonia...
...Pois se jura, se esconjura
Se ama e se tortura
Se tritura, se atura e se cura
A dor
Na orgia...
Pra mim
Basta um dia
Não mais que um dia
Um meio dia
Me dá
Só um dia
E eu faço desatar
A minha fantasia
Só um
Belo dia
Pois se jura, se esconjura
Se ama e se tortura
Se tritura, se atura e se cura
A dor
Na orgia
Da luz do dia
É só
O que eu pedia
Um dia pra aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia
Só um
Santo dia
Pois se beija, se maltrata
Se come e se mata
Se arremata, se acata e se trata
A dor
Na orgia
Da luz do dia
É só
O que eu pedia, viu
Um dia pra aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia
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Letra e música de Chico Buarque