A época histórica. Fim da história?

Alfredo Maciel da Silveira
Julho 2017

Desde os fins do século XX generalizou-se o senso comum de que o capitalismo "venceu" a disputa com o socialismo. Pensadores à direita do espectro político então propugnaram a tese do "fim da história". Já pelo lado da esquerda grassou e ainda grassa o desapontamento com o socialismo, que "não deu certo" , que "não funciona".

Os males do capitalismo todavia se reproduzem agora com força avassaladora em meio à acelerada reestruturação produtiva na nova escala da globalização. E o reconhecimento desses males - por exemplo suas crises cíclicas, concentração da riqueza, critério privado de alocação dos recursos, exclusão social, anarquia da produção, populações em fuga da fome e das guerras, desequilíbrios ambientais - está longe de ser exclusividade de um pensamento crítico marxista. O mesmo se pode dizer quanto às propostas de políticas mitigadoras daqueles males, apontando até para reformas tendencialmente anticapitalistas, formuladas por insuspeitas instituições e líderes empresariais, ícones do capitalismo contemporâneo.

Crise da Música

João Cezar Pierobon
Julho 2017

A velha ordem, como a denomina Arthur M. Schlesinger Jr, desabou na esteira da Grande Depressão, que se iniciou ao final dos anos 1920, e veio justo no período de sua crise que ele localiza entre os anos de 1919 e 1933. A crise da velha ordem da música, talvez numa ousada antecipação, teve o seu começo antes, nas fronteiras entre os séculos XIX e XX, nos estertores do movimento romântico. O mundo da razão começava a dar a sua medida. Roland de Candé, na sua História Universal da Música (Martins Fontes), dá algumas pistas sobre o início da crise da velha ordem musical. A coisa começou sobre o que se entendia ser consonância e dissonância entre dois sons simultâneos. O intervalo, que é a diferença de frequência entre esses dois sons, medida pelo quociente de suas frequências, então seria consonante ou dissonante. Por que um intervalo seria consonante, ou belo, e outro, dissonante, algo áspero, seria feio? Qual o ouvido absoluto que poderia julgar sobre a beleza, ou feiura, de um dado intervalo, ou acorde? E o efeito do timbre, ou vozes em polifonia ou homofonia? Um dado intervalo seria dissonante em um instrumento, e em outro seria consonante? Schubert, Schumann, Chopin e Liszt não estiveram nem aí para essa história. Então emanciparam a dissonância. Como deixar de achar belas certas composições de Debussy que usou e abusou de acordes dissonantes? Há poesias musicais dele que são flores envoltas por névoas sob a intensa lua azul no céu da noite. São doçuras sonoras. Mas, como soe acontecer, fizeram o diabo. Houve dissonâncias e mais dissonâncias, verdadeiras esculturas musicais da monotonia. Um mundo plano, igual,  sem mudança de cor. Houve até mesmo música do silêncio. Como um quadro branco diante do qual alguns exegetas dão chiliques de êxtases. Então veio Harold Bloom e disse: “tudo desmoronou, o centro não resistiu, e a pura e simples anarquia se desencadeia sobre o que, antes, se chamava mundo culto.” ( O Cânone Ocidental, Objetiva).  

Canto das Três Raças

Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro

Ninguém ouviu
Um soluçar de dor
No canto do Brasil
Um lamento triste
Sempre ecoou
Desde que o índio guerreiro
Foi pro cativeiro
E de lá cantou

Negro entoou
Um canto de revolta pelos ares
No Quilombo dos Palmares
Onde se refugiou

Fora a luta dos Inconfidentes
Pela quebra das correntes
Nada adiantou

E de guerra em paz
De paz em guerra
Todo o povo dessa terra
Quando pode cantar
Canta de dor

ô, ô, ô, ô, ô, ô
ô, ô, ô, ô, ô, ô

ô, ô, ô, ô, ô, ô
ô, ô, ô, ô, ô, ô

E ecoa noite e dia
É ensurdecedor
Ai, mas que agonia
O canto do trabalhador

Esse canto que devia
Ser um canto de alegria
Soa apenas
Como um soluçar de dor