Em Junho de 2019, ao introduzir uma entrevista do Prof. Jean Ziegler publicada neste Blog dizíamos que “(...)Carecemos de uma alternativa consistente ao capitalismo, uma proposta elaborada democraticamente que desenhe uma outra sociedade, que garanta a preservação do planeta, a extinção da miséria e a redução das desigualdades.” Agora, em entrevista ao jornal francês “Le Point”, Thomas Piketty lança um novo livro “Que venha o socialismo” no qual retoma o desafio de desenhar uma alternativa democrática ao capitalismo.
Na apresentação da obra, o
autor defende que não podemos nos contentar em sermos “contra” o capitalismo ou
o neoliberalismo e que é preciso ser “a favor” de algo. Segundo ele, apesar das
críticas existentes, socialismo continua sendo o termo mais adaptado para
designar a idéia de um sistema econômico alternativo ao
capitalismo. Abaixo a reportagem da “Carta Capital”* diz mais sobre tal
proposta.
__________________________________
Em novo livro, Piketty defende socialismo e diz: ‘desigualdade não gera crescimento’
Autor defende que não se deve somente ser contra o capitalismo ou neoliberalismo; é preciso ser a favor de algo.
A revista francesa Le Point
desta semana traz uma entrevista com o economista francês Thomas Piketty. O
autor do best seller “O Capital no Século XXI” acaba de lançar um livro no qual
reúne suas crônicas econômicas publicadas nos últimos quatro anos.
Após a publicação em 2019 de
“Capital e Ideologia”, um livro de mais de 1.200 páginas, e de um filme
documentário que estreou este ano e cujo título retoma o nome seu best seller,
Piketty lança este mês “Vivement le socialisme!”, título que poderíamos
traduzir como “Que venha o socialismo!”.
O economista Thomas Piketty |
Na apresentação da obra, o
autor defende que não podemos nos contentar em sermos “contra” o capitalismo ou
o neoliberalismo e que é preciso ser “a favor” de algo. Segundo ele, apesar das
críticas existentes, socialismo continua sendo o termo mais adaptado para
designar a idéia de um sistema econômico alternativo ao capitalismo.
Nas páginas da revista Le Point
o economista francês mais conhecido da atualidade denuncia novamente o que
classifica como uma narrativa da desigualdade, imposta ao mundo desde o início
dos anos 1980 pelo que ele chama de “revolução de Ronald Reagan”.
Piketty usa o exemplo dos
Estados Unidos, que entre 1930 e 1980 aplicaram impostos visando os mais ricos,
que chegaram a 90%.
No entanto, relembra o francês,
Reagan foi eleito em 1981 e implementou uma reforma fiscal que reduziu os
impostos a uma média de 28%.
“Os Estados Unidos são um caso
extremo”, diz Piketty. “Eles inventaram um imposto progressivo bastante
elevado, como em nenhum outro lugar, mas logo em seguida, com o mesmo vigor,
foram no sentido oposto.”
O economista explica que o
objetivo da Casa Branca na época era incentivar o crescimento do país, mesmo
que isso representasse um possível aumento das desigualdades.
Renda dos americanos caiu pela metade em 30 anos
Ao avaliar a estratégia de Reagan, Piketty argumenta que a ideia do presidente não era absurda, mas não deu certo. “Trinta anos mais tarde, constatamos que os americanos não alcançaram o aumento de renda esperado e, ao contrário, a taxa de crescimento da renda por habitante caiu pela metade entre 1990 e 2020.”
Além disso, os salários dos
mais pobres estagnaram – um fenômeno que, segundo o francês, ajudaria a
explicar a instabilidade política atual nos Estados Unidos.
“O sistema de desigualdade no
qual se construiu a globalização desde os anos 1980 não apenas foi ineficaz
para gerar crescimento, como também é cada vez mais insustentável do ponto de
vista político. A classe média e os mais pobres não querem mais isso e votam
contra a Europa e a globalização sempre que podem”, lança o economista, citando
como exemplo o apoio, principalmente entre o eleitorado mais jovem, às
propostas de Elizabeth Warren e Bernie Sanders para a criação de uma taxa anual
de 8% para os bilionários nos Estados Unidos.
Se inspirar no que deu certo no século 20
Ainda usando o caso norte-americano, Piketty fala da questão da educação como outro parâmetro da desigualdade. Se o crescimento nos Estados Unidos caiu pela metade desde os anos 1980, isso se deve também à estagnação educativa, acusa o economista.
“O país ainda tem grandes
universidades, ricas e no topo dos rankings, mas 70% dos americanos mais pobres
não têm acesso a uma boa educação. Os Estados Unidos perderam seu avanço
histórico nessa área”, aponta Piketty.
O francês utiliza o exemplo da
economia norte-americana antes de Ronald Reagan para, como ele mesmo afirma, se
basear no que teria dado certo no mundo durante o século 20.
“Eu mencionei o imposto
progressivo dos Estados Unidos – que cobra mais dos que ganham mais – porque
ele permitiu reduzir muito a desigualdade sem impedir o crescimento, pois a
receita gerada – pelos encargos – serviu para investir na educação, na saúde e
nas infraestruturas”, detalha o francês.
“A lição que podemos tirar de
tudo isso é que correr em busca de cada vez mais desigualdade não é o que gera
crescimento econômico”, resume Thomas Piketty nas páginas da revista Le Point.
___________________________
(*) Originalmente publicado em Carta Capital-Economia, 9 de outubro de 2020.
Leia também: Fadiga do capitalismo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário