Em artigo
publicado, no dia 27/04/2019, no jornal O ESTADO DE SÃO PAULO, sob o título “O
OPOSICIONISMO RETÓRICO E OS DEMOCRATAS”, o professor titular de Teoria Política
e coordenador do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da Unesp, Marco
Aurélio Nogueira, afirma que “estamos sendo vitimados pela escassez de
coordenação democrática”.
De fato, o
clima de radicalização e intolerância política tem dificultado – senão impedido
– a aglutinação das forças democráticas, sob o argumento de que a unidade somente
possa se dar em torno dos chamados “progressistas”, embora o autor chame a atenção
para o fato de que nem esses segmentos têm condições de oferecer uma definição
minimamente razoável sobre o conceito.
Chama atenção,
também, para o fato de que a oposição deve superar a postura de “... um
oposicionismo retórico, inócuo, que vive da estridência e gira em círculos, sem
sair do lugar”. Nesse sentido, ele aponta que será imperioso o
reconhecimento dos erros cometidos e uma compreensão mais ampla dos efeitos políticos
e culturais da globalização e da revolução tecnológica, inclusive devendo
apresentar visão alternativa para as questões da atualidade (como a reforma da
previdência).
Em resumo,
o Autor entende que cabe aos democratas, de centro e de esquerda, liberais e
socialistas, sob visão política e programa de atuação com claros princípios éticos,
morais, teóricos, mostrar como escapar da tragédia que ameaça o Estado Democrático
de Direito.
Não
obstante, em minha opinião, além dos aspectos fundamentais corretamente
apontados pelo Autor, entendo que o conjunto das forças democráticas que vier a
ser produzido nesse processo deverá estar atento para que pontos básicos que deverão nortear essa
Unidade. Nesse sentido é fundamental entender a profundidade e as causas que
têm levado derrotas, no Brasil e no Mundo, às forças democráticas. Entender o
momento e a correlação de forças será fundamental para estabelecer os pontos
básicos que deverão sedimentar a unidade.
Leia
abaixo a íntegra do artigo
MARCO AURÉLIO
NOGUEIRA - O Oposicionismo Retórico e os Democratas
Estamos
sendo vitimados pela escassez de coordenação democrática
Em política,
quem está contra não é necessariamente oposição. Pode bloquear um adversário,
dificultar sua ação, mas não organizar ou fornecer diretrizes à sociedade.
Estigmatiza e produz atrito, mas não demarca um campo de luta.
Faz tempo que estamos sem oposição. Durante os anos
petistas, o domínio do governo foi tão intenso que paralisou o PSDB e tudo o
que se contrapunha ao PT. Havia um só bloco, por mais que existisse a sensação
de que um bloco alternativo sobrevivia. No período FHC o PT foi a voz da
contestação intransigente, mas não teve poder de fogo para direcionar os
cidadãos: limitou-se a mobilizá-los em torno de cláusulas genéricas que não
continham uma proposição capaz de suportar chuvas e trovoadas. Venceu em 2002
graças à fadiga de material dos tucanos. Quando Dilma foi levada ao
impeachment, a oposição veio das ruas, de modo desorganizado e sem saber o que
pôr no lugar. Foi essa oposição caótica que elegeu Bolsonaro.
Oposição
mesmo – com ideias claras, força magnética, capacidade de articulação e lideranças
plurais efetivas – só houve na fase final da luta contra a ditadura, entre 1978
e 1985, quando o MDB foi o mar aberto em que desaguou a ampla frente democrática
que dissolveu a credibilidade do regime autoritário e preparou o caminho para a
volta da democracia.
Dado o
estado calamitoso da política nacional e do governo Bolsonaro, deveriam estar
todos buscando empreender uma ação que recomponha a sociedade e o Estado, dando
um eixo aos cidadãos. Será difícil confrontar a onda bolsonarista – que é “societal”,
ideológica e digital, desdobrando-se numa obra de intensa deseducação política –
sem uma oposição democrática consistente, ao mesmo tempo serena, firme e
contundente.
Percebendo
que falta articulação, lideranças de esquerda falam em criar uma “Unidade
Progressista” que arregimente os que são contra Bolsonaro e mostre que há um
campo de forças alternativo com capacidade de interpelação. A ideia, porém,
esbarra num vício recorrente da política brasileira mais à esquerda: a de só
olhar para o próprio umbigo, excluindo segmentos que poderiam dar à frente
pretendida uma envergadura especial. Em vez de trabalhar para unir os
democratas, a “Unidade” dirige-se somente aos “progressistas”, sem deixar claro
o que entende por isso. Ainda que seus propositores digam o contrário, a
manobra visa a fornecer oxigênio ao PT e a seus satélites, se possível
subalternizando lideranças como Marina Silva e Ciro Gomes. Sua meta é adquirir
competitividade para enfrentar as eleições municipais de 2020, mais que
contribuir para a formação de um arco de forças que se oponha ao governo atual.
Só pode haver
oposição se houver visão política e programa de atuação com claros princípios éticos,
morais, teóricos, que expliquem a realidade aos cidadãos e os auxiliem a
interpretar as opções que se tem pela frente, mostrando que há como escapar da
tragédia que ameaça o Estado Democrático de Direito, a articulação cívica da
sociedade, as instituições políticas e a própria estrutura da economia. Como a
tarefa é enorme, não será viabilizada de forma seletiva, com vetos e exclusões,
ou com foco concentrado em “movimentos sociais” e nichos identitários.
Sem tal
inflexão, ter-se-á esperneio e cálculo eleitoral, mas pouca eficácia e organização
política.
Parte
expressiva do dilema atual é que não há uma oposição ao governo Bolsonaro.
Quando muito, há mal-estar e resistência. A medíocre base governista não sabe o
que quer e mal consegue defender o governo, que se queima com o fogo amigo. O “centrão”
não se opõe, mas se reposiciona e busca obter vantagens. Desgasta o governo sem
se apresentar como opção a ele. Os oposicionistas mais à esquerda comemoram
quando o governo mostra desarticulação e recua, como no caso das discussões
sobre a reforma da Previdência. Aplaudem quando os governistas atiram nos próprios
pés. Levam ao extremo o direito de obstruir votações e barrar uma reforma que
julgam errada. Valem-se do jogo regimental e da agitação, como faz toda oposição,
denunciando as injustiças e pondo-se em defesa do povo pobre.
Em nenhum
momento, porém, oferecem uma visão alternativa da Previdência, não explicam a
real situação da área, se há ou não privilégios a serem corrigidos, se a crise
existe ou não, resumem todo o problema a um expediente “neoliberal” para
sacrificar os mais frágeis.
É um
oposicionismo retórico, inócuo, que vive da estridência e gira em círculos, sem
sair do lugar. Ele amplia a confusão nacional, em vez de reduzi-la.
Cabe aos
democratas, de centro e de esquerda, liberais e socialistas, agir para que se
saia dessa agonia. A derrota da democracia em 2018 se deveu ao aguçamento das
polarizações e à diluição dos consensos que poderiam direcionar a sociedade.
Polos extremados pouco farão para promover as recomposições necessárias e
desenhar uma agenda futura sustentável.
Quanto
mais tempo levarem os democratas para romper a letargia que os tem paralisado,
pior ficará. Eles estão obrigados a cavar fundo, reconhecer erros, compreender
os efeitos políticos e culturais da globalização, da revolução tecnológica e da
conversão “líquida” da vida. Devem trocar a retórica combativa, militante,
indignada, mas romântica e ingênua, pelo duro amassar de barro da política
realista. Precisam de coragem para ir além da terra conhecida, partindo dela
para abrir novos horizontes e resgatar os náufragos da vida.
A obra da
redemocratização está sendo dilapidada. Chegamos a um ponto em que nos falta o
fundamental: unidade política, consensos democráticos, responsabilidade cívica
e boas estruturas de ação (partidos).
Não é um
problema só de excesso de autoritarismo, despreparo e reacionarismo grosseiro,
essas pragas que corroem a sociedade. Também estamos sendo vitimados pela
escassez de coordenação democrática.
É o comunismo/-socialismo disfarçado de democrático/progressista...vão enganar outros..
ResponderExcluirFora comunas safados..
É necessária a recomposição de um centro democrático composto por diferentes tendências ideológicas para voltarmos a um estado de equilíbrio. Se isto não ocorrer, o clima de faroeste inaugurado na era Lula e continuado na era atual vai se agravar . Isso interessa a alguém? Claro que não
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