No próximo dia 18/11/17 Giocondo Dias faria 104 anos. Da
direção do PCB, o Partidão como era conhecido, ele foi o maior responsável pela mudança da orientação política do
Partido contida na Declaração de Março
de 1958 e pela aprovação da linha política de resistência democrática à ditadura de 1964. Em 1982 foi eleito secretário-geral do PCB. Morreu em 07/09/1987.
COMUNISTAS E CATÓLICOS : DO CONFRONTO AO DIÁLOGO*
A problemática do mundo contemporâneo acabou por revelar tanto o equívoco quanto o anacronismo deste confronto. Às dramáticas questões postas pelo curso do desenvolvimento histórico no período posterior à Segunda Guerra Mundial , somaram-se , da parte comunista, o renascimento do marxismo( após o XX Congresso do PCUS (Partido Comunista da União Soviética e seus desdobramentos) e, do lado católico, a emergência de interpretações teológicas comprometidas com processos de mudança social. Este duplo movimento alcançou um estágio qualitativamente novo nos anos sessenta: as relações entre comunistas e católicos elevaram-se do confronto para o nível do diálogo.
Dias escreveu o texto abaixo há trinta e seis anos. Hoje a intervenção política conjunta de comunistas e católicos, de marxistas e
cristãos, não só no Brasil como no mundo
ampliou-se muito e reflete-se com força nos escritos e discursos do Papa
Francisco.(Sergio Augusto de Moraes ,Novembro de 2017)
COMUNISTAS E CATÓLICOS : DO CONFRONTO AO DIÁLOGO*
Giocondo Dias
Historicamente as relações entre comunistas e católicos
revestiram-se de um caráter tenso em extremo: na prática social , uma larga
coincidência de reivindicações era
obscurecida por mútuo sectarismo e dogmatizada por questões de princípio
invocadas indevidamente.
A convergência de requisições de grande significado- fraternidade,
justiça social, solidarismo - desaparecia
em face de inoportunos apelos ao passado histórico da Igreja Católica,
por parte dos comunistas, e de um falso dimensionamento dos erros destes em
conjunturas particulares, do lado dos católicos. E a real incompatibilidade filosófica entre marxismo e qualquer gênero de
teísmo era transformada em antagonismo
político-social entre os dois
interlocutores.
A problemática do mundo contemporâneo acabou por revelar tanto o equívoco quanto o anacronismo deste confronto. Às dramáticas questões postas pelo curso do desenvolvimento histórico no período posterior à Segunda Guerra Mundial , somaram-se , da parte comunista, o renascimento do marxismo( após o XX Congresso do PCUS (Partido Comunista da União Soviética e seus desdobramentos) e, do lado católico, a emergência de interpretações teológicas comprometidas com processos de mudança social. Este duplo movimento alcançou um estágio qualitativamente novo nos anos sessenta: as relações entre comunistas e católicos elevaram-se do confronto para o nível do diálogo.
No plano teórico, parece que o diálogo-aliás atual no Brasil
dos dias correntes- deve ser construído à base de mútuo respeito por posições
que se sabem diferentes : o objetivo de cada
interlocutor não pode ser a “conversão”
do outro, mas extrair das posições contrárias elementos para enriquecer e aprofundar as suas
próprias, numa lúcida atitude de questionamento e autocrítica.
No plano prático, sem escamotear divergências quanto a
projetos sociais de maior amplitude histórica, a intervenção conjunta de
comunistas e católicos está na ordem do dia. A experiência da vida política
brasileira, nos últimos anos , provou cabalmente que esta ação comum não só é
possível como desejável: combater o terrorismo social do capitalismo
dependente, expresso politicamente na ditadura e no fascismo, e o seu
terrorismo econômico, manifesto na miséria e na marginalização das massas, exige a unidade de esforços.
A prática da resistência democrática foi fecunda para os
comunistas , libertos dos dogmas, e para os católicos, empenhados em alterar a
condição dos pobres e oprimidos. Os
primeiros compreenderam definitivamente que o engajamento dos católicos no
combate pela democracia amplia o arco de
forças que luta pela justiça e pelo progresso social. Os católicos reconheceram
, no dia a dia, que há uma indiscutível
congruência entre a nossa perspectiva socialista e os anseios evangélicos de
justiça, fraternidade e plenitude espiritual.
É preciso, resgatando o legado desta prática, recuperá-la e
aprofundá-la. É necessário explicitar que esta exigência é colocada pela
própria realidade: o Brasil justo e democrático que pretendemos construir, na
transição socialista, pertence e será obra de todos- comunistas e católicos ( e
não só dos católicos progressistas: urge estabelecer um diálogo honesto com
todas as diferenciadas tendências da
comunidade católica). O que é fundamental , todavia, é deixar claro que as relações
entre os comunistas e católicos não podem ser instrumentais. Devem , têm que passar pelo profundo respeito pela identidade de cada um dos intervenientes.
O partido comunista não é uma igreja, assim como a igreja não
é um partido político. Um católico, sem romper com a sua comunidade religiosa, deve encontrar no partido um clima de liberdade: um
comunista atuando junto de organizações católicas, não deve ser discriminado.
O trabalho conjunto de comunistas e católicos, no Brasil, hoje, não é uma
petição de princípio, abstrata ou idealista. É uma exigência do processo
histórico. E que, felizmente, já conta com o respaldo da experiência dos anos
recentes. Sem se confundir institucionalmente, partido e comunidade religiosa têm um amplo espaço comum a ser
explorado. E da exploração deste espaço, depende, em larga medida, o perfil do
Brasil do futuro.
*Publicado na Voz da Unidade, nº58, 29/05 a4/06/1981, São
Paulo, SP.
Do ponto de vista político, formar frente com os religiosos é uma atitude correta, pois, muitas vezes, o inimigo é comum. No entanto, não se justifica, como ocorreu, negligência no Partido ao admitir em seus quadros pessoas absolutamente desprovidas de conhecimento sobre o marxismo e o materialismo dialético.
ResponderExcluirJoão Cezar Pierobon 28 de novembro de 2017
ResponderExcluirO texto do Giocondo é magnífico e diz muito bem do porquê o Giocondo era o Giocondo. Simples, direto, limpo. Clareza política do momento, como raros conseguem ter. E que nos faz muita falta hoje. É uma pena que o Brasil de hoje vive um momento de rarefação, não só de poetas e grandes músicos, como defendo, mas, também de políticos que possam ver além desse pobre horizonte em que vivemos. Os nossos pensadores também estão se rarefazendo. Mas, isso não indicaria um certo ceticismo meu, o que poderia me conduzir ao pessimismo negativo, ou mesmo ao niilismo. Encaro o ceticismo como o primeiro momento do conhecimento. Bertrand Russell se dizia cético, mas, nunca deixou de pensar sobre a verdade, que buscava na filosofia da matemática, ou filosofia analítica. Giocondo nos deixou há muito tempo, e parece que ainda está por aí. O seu legado, delicado como o de uma poesia, que canta um canto sublime, certamente nos aquece, como o diria Oswaldo Aranha, nesse frio deserto de ideias, e nos dá um caloroso motivo para continuar acreditando no Brasil.
O comentário do amigo e poeta J.C. Pierobon estimula aqueles que querem fazer do Brasil um país melhor, menos desigual, mais educado, mais transparente.Valeu!
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