Joana Pessoa, Historiadora
Ricardo Pessoa, Bancário Aposentado
“A democracia é a melhor entre todas as formas possíveis de governo, ainda que seja capaz de apresentar problemas de toda espécie, como promessas demais, muitas das quais descumpridas. Existe a corrupção. Mas a democracia é muito valiosa e precisamos reformá-la e protegê-la dela própria. É muito ruim que a maior economia do mundo, que é também a mais antiga democracia moderna, esteja nas mãos de um populista. Na Europa, a direita também está em ascensão. Por trás disso tudo está, infelizmente, a estagnação econômica. As pessoas ficam furiosas. Nesse estado, elas se tornam demagogas”.(Entrevista de Adrian Wooldridge, ‘O Estado inteligente’, Publicado em VEJA de 18 de outubro de 2017, edição nº 2552)
Nos anos 80 vimos declinar, em grande parte do mundo, a influência da ideologia socializante. Essa tendência pode ser claramente observada no enfraquecimento das políticas voltadas para a criação de um Estado de Bem Estar – decorrente de pacto social-democrata que vigeu em toda Europa desde o fim da II Grande Guerra Mundial -, o que redundou em privatizações, maior competitividade, perda de diversas conquistas sociais e estímulos ao livre mercado.
A atual onda de descontentamento com os chamados políticos tradicionais tem revelado forças "antissistema" de cunho nacionalista e anticapitalista: o UKIP no Reino Unido, a Frente Nacional francesa ou o Podemos espanhol exemplificam a tendência. À direita ou à esquerda, tais partidos têm em comum a reafirmação dos chamados estados nacionais e a retórica contrária ao mercado financeiro e à globalização.
Ricardo Pessoa, Bancário Aposentado
“A democracia é a melhor entre todas as formas possíveis de governo, ainda que seja capaz de apresentar problemas de toda espécie, como promessas demais, muitas das quais descumpridas. Existe a corrupção. Mas a democracia é muito valiosa e precisamos reformá-la e protegê-la dela própria. É muito ruim que a maior economia do mundo, que é também a mais antiga democracia moderna, esteja nas mãos de um populista. Na Europa, a direita também está em ascensão. Por trás disso tudo está, infelizmente, a estagnação econômica. As pessoas ficam furiosas. Nesse estado, elas se tornam demagogas”.(Entrevista de Adrian Wooldridge, ‘O Estado inteligente’, Publicado em VEJA de 18 de outubro de 2017, edição nº 2552)
Na esteira do colapso do Bloco Socialista (representado
pela queda do Muro de Berlim em 1989 e pelo fim da União Soviética em dezembro
de 1991), assistimos ao fortalecimento do neoliberalismo, consubstanciado no
chamado “consenso de Washington”, e cujos principais expoentes foram o presidente
Ronald Reagan (1981/1989) e a primeira-ministra Margareth Thatcher (1979/1990).
Nos anos 80 vimos declinar, em grande parte do mundo, a influência da ideologia socializante. Essa tendência pode ser claramente observada no enfraquecimento das políticas voltadas para a criação de um Estado de Bem Estar – decorrente de pacto social-democrata que vigeu em toda Europa desde o fim da II Grande Guerra Mundial -, o que redundou em privatizações, maior competitividade, perda de diversas conquistas sociais e estímulos ao livre mercado.
Já com a crise de 2007/8 é o neoliberalismo que entra em
xeque, apresentado um quadro de permanente turbulência nos mercados financeiros
e altas taxas de desemprego, cenário agravado com a crise dos refugiados. É
nesse novo contexto que nos deparamos com o crescimento do populismo.
A atual onda de descontentamento com os chamados políticos tradicionais tem revelado forças "antissistema" de cunho nacionalista e anticapitalista: o UKIP no Reino Unido, a Frente Nacional francesa ou o Podemos espanhol exemplificam a tendência. À direita ou à esquerda, tais partidos têm em comum a reafirmação dos chamados estados nacionais e a retórica contrária ao mercado financeiro e à globalização.
Assim, notícias revelando o crescimento eleitoral de posições
extremadas nos assombram cada dia mais e nos põem diante de "um museu de
grandes novidades". A ascensão de Donald Trump à Casa Branca, o Brexit e a
vitória dos votos antiestablishment, anti-imigrantes e anti-União Europeia na
Hungria e na Polônia. Além das expressivas votações recebidas por Marine Le Pen
(Frente Nacional), Jean-Luc Mélenchon (França Insubmissa), Geert Wilders
(Partido para a Liberdade, dos Países Baixos) e por Nobert Hofen (Partido da
Liberdade da Áustria), que, nas eleições realizadas em outubro de 2017,
conquistou 62% das Cadeiras do Parlamento juntamente com o centro-direitista
Partido do Povo Austríaco de Sebastian Kurtz (centrando sua campanha contra a
imigração). Finalmente, a entrada do AfD no Parlamento alemão (será a primeira
vez, desde o fim da Segunda Guerra Mundial, que um partido de extrema direita
comporá o Bundestag).
É interessante notar que, mesmo na Alemanha, país com a
mais forte economia dentro da zona do Euro, o quadro de recrudescimento do
populismo favoreceu o fortalecimento da extrema-direita.
O número de votos angariados por esses partidos é
diretamente proporcional ao aumento do sentimento de frustração experimentado
por setores das sociedades europeia e estadunidense. Desde o fim da Guerra Fria
(início dos anos 1990), esse cidadão vivencia as consequências do desmonte do
Estado do Bem-Estar social (especialmente na Europa Ocidental) e das novas
facetas do processo produtivo (terceirização, transferência dos parques
industriais do primeiro para áreas com menores custos de produção, redução da
mão-de-obra, etc.). De modo geral, as pessoas entendem que vêm perdendo
qualidade de vida, sentem que não há perspectiva de melhora pela via da
política "tradicional" (cujos representantes estariam "longe do
povo") e que "no passado era melhor".
Essa percepção alimenta e é alimentada pelo populismo, que
simplifica as causas históricas para a atual crise e promete soluções de curto
prazo. Como resultado, as bandeiras desses movimentos falam em nacionalismo e
antiglobalização, sensibilizando largos setores da sociedade. A promessa de
Trump de fazer a América grande novamente ou a disposição de Marine Le Pen de
rever a participação francesa na união monetária europeia, por exemplo, trazem
alento ao americano desempregado ou ao francês para quem o franco, além de lhe
proporcionar comprar mais coisas, estaria carregado da identidade de uma França
soberana e genuína.
Diante dessa retórica ultradireitista, refugiados e
imigrantes (em 2015, a Comissão Europeia anunciou estarmos diante da maior
crise migratória desde a Segunda Guerra) serão acusados de trazerem ainda mais
desemprego e a degeneração dos valores nacionais tradicionais, além de
terrorismo.
O nacionalismo xenófobo e o soberanismo, bem como os
discursos islamofóbicos e antieuropeu, ameaçam a democracia. De modo geral, a
ultradireita ergue muros, reedita a lógica do nós contra eles e da defesa de
uma suposta civilização, remetendo à tradição do nacionalismo romântico e
imperialista do século XIX. E, especificamente no caso europeu, o extremismo de
direita ameaça a própria União Europeia, projeto costurado a partir do fim da
Segunda Guerra, e de tão importante contribuição para "o avanço da paz e a
reconciliação, a democracia e os direitos humanos." (Presidente do Comitê
do Prêmio Nobel, ao entregar o Nobel da Paz à União Europeia, em 2012).
O fato é que as posições identificadas com o centro
político, notadamente os sociais-democratas e socialistas, têm se enfraquecido
em toda a Europa, decorrência, em grande medida, das políticas de austeridade
que favorecem o fortalecimento das opções populistas. Para se opor às propostas
populistas, a grande dificuldade dessas forças tem sido construir um difícil
equilíbrio que as distancie das políticas conservadoras sem cair na retórica antissistema.
Merkel e Macron têm diante de si um enorme desafio:
promover reformas nas estruturas da União Europeia que aprofundem o processo de
unificação e ao, mesmo tempo, desenvolver políticas que neutralizem o
crescimento dos movimentos populistas que, justamente, atuam em sentido
contrário. Não poderemos ignorar que esses dois líderes, representantes das
duas maiores economias da região do Euro, terão a tarefa de reestruturar as
bases da União, bastante comprometidas em função do crescimento desses movimentos
de ultadireita, populistas e antissistema. Esses esforços também poderão se
tornar mais penosos em função de como se dará a evolução da questão Catalã, que
poderá trazer maiores dificuldades à economia espanhola e, em último caso, à
estabilidade econômica do Bloco como um todo.
Inquestionavelmente, a chamada "globalização"
deve ser humanizada, suas possibilidades de negociação, pluralismo e debate,
aprofundadas. O populismo está na contramão desse sonho. Um caminho para a
superação desses problemas é aumentar a participação popular, em especial da
juventude, – fortalecendo a democracia – e garantir a inclusão social para
combater a xenofobia e o populismo de extrema-direita ou de esquerda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário