O artigo abaixo levanta
questões importantes, mas, por tentar resumir em poucas páginas acontecimentos
de décadas, tropeça em algumas frases como tachar Lênin de jacobino. Alguém que
escreveu "O esquerdismo, doença infantil do comunismo" ou lutou pela
NEP, dentre outros escritos e posições, jamais poderia ser tachado de jacobino.
Segue o
artigo
________________________________________
Para os petistas, o governo Lula está em disputa
Luiz Carlos Azedo*
Abril/2023
O choque se dá entre a bancada do PT na Câmara e a equipe econômica, liderada por três ex-candidatos à Presidência: Haddad, Alckmin e Simone Tebet
O jacobinismo é uma invenção
dos seus adversários. Seu significado restrito refere-se ao período entre 1789
e 1799 da Revolução Francesa, quando os mais ardorosos integrantes do Terceiro
Estado, na Assembleia Nacional, formaram o chamado “Club Breton”, que viria se
transformar na “Societè des amis de la Constituicion”. Como se reuniam no
convento dos dominicanos (ou “jacobins”) da rue Saint-Honoré, em Paris,
passaram a ser chamados pejorativamente de jacobinos. Com o tempo, os jacobinos
se tornaram paradigma de revolucionários, com uma missão nacional-patriótica,
ética e social.
Luiz Carlos Azedo |
Na Revolução Russa de 1917, o
jacobinismo foi resgatado pelo líder comunista Vladimir Lênin, em contraposição
à social-democracia da II Internacional. Virou paradigma de chegada ao poder,
como na China, em 1949, e em Cuba, em 1959. Confundir a tomada do poder com a
revolução passou a ser o grande objetivo da esquerda revolucionária. A fórmula
básica era: a política começa onde estão as massas. Para ser bem-sucedida, a
insurreição deve se apoiar no proletariado; para inspirá-lo, sua vanguarda é um
partido revolucionário, cujos objetivos e interesses devem estar em sintonia
com o povo. Uma fórmula supostamente mágica.
No Brasil, houve dois momentos
marcantes de jacobinismo. O levante comunista de 1935, liderado por Luiz Carlos
Prestes, que nunca teve a menor chance dar certo, mas estava em sintonia com a
política insurrecional da chamada III Internacional; e a luta armada contra o
regime militar, na década de 1970, liderada pelo líder comunista Carlos
Marighella, que também não teve a menor possibilidade de êxito. Desde a crise
de 1964, uma parcela da esquerda acreditava que a tomada do poder tornaria o
socialismo inexorável. Não foi o que aconteceu, apesar da grande mobilização popular
na campanha das Diretas, Já. A derrocada dos militares veio mesmo foi com a
eleição de Tancredo Neves, um político moderado, no colégio eleitoral.
O PT é o último grande partido
operário criado no século XX, quando a grande indústria taylor-fordista já
estava superada pelo toyotismo e os sistemas de produção flexíveis estruturados
em cadeias globais de valor. As lideranças de esquerda que participaram da luta
armada, que estiveram presas ou no exílio, vertebraram sua organização, sob a
liderança do presidente Luiz Inácio lula da Silva, então líder sindical
metalúrgico. As outras vertentes são a sindical, cuja influência já não é a
mesma, e setores ligados às comunidades eclesiais de base, muito reprimidas
pelos papas João Paulo II e Bento XVI. Com o tempo, parlamentares, prefeitos e
a burocracia passaram a ter muito mais peso do que as bases sindicais e
populares, mas não a ponto de suplantar o prestígio eleitoral de Lula.
Coalizão ampla
O êxito político do PT é
invejável. Por cinco vezes, três com Lula e duas com a ex-presidente Dilma
Rousseff, venceu as eleições presidenciais. Desde 2002, é a principal força
política democrática do país, o que demonstrou durante o governo de Jair
Bolsonaro, quando comeu o pão que o diabo amassou. Com a chegada do PT ao poder,
as forças com as quais emulava no campo da esquerda, principalmente o PSDB,
foram sendo abduzidas pelo transformismo. Durante o governo Bolsonaro, as bases
eleitorais da centro-esquerda derivaram à direita, atraídas por narrativas
reacionárias. A justa crítica ao jacobinismo petista foi substituída pelo
anticomunismo que põe no mesmo balaio até mesmo os liberais.
No primeiro turno das eleições
passadas, a política de frente de esquerda deu ao PT a hegemonia no campo da
oposição ao governo Bolsonaro, mas não a vitória. Foi preciso ampliar as
alianças ao centro, principalmente com atual ministra do Planejamento, Simone
Tebet (MDB), que também havia disputado primeiro turno, para derrotar Jair
Bolsonaro (PL), por estreita margem. Mais ainda: para Lula tomar posse e
articular a base governista no Congresso. Por isso, a formação de um governo de
ampla coalizão democrática decorre mais da correlação de forças do que do
programa eleitoral de Lula. Esse é o busílis.
Para a cúpula petista, o
governo Lula está em disputa, entre seu principal partido, o PT, e seus aliados
de centro-esquerda. O choque principal se dá entre a bancada do PT na Câmara e
a equipe econômica do governo, liderada por três ex-candidatos a presidente da
República: Fernando Haddad (PT), Geraldo Alckmin (PSB) e Simone Tebet (MDB).
Essa disputa pode paralisar o governo e implodir suas alianças. Os setores
radicais do PT precisam se convencer de que o governo Lula não é jacobino. A
agenda do governo, para ser bem-sucedida, deve ser focada no programa que
unifica a coalizão e não numa disputa esquerda versus direita, que está
afastando lideranças que desejariam apoiar o governo, mas o próprio presidente
Lula, sob pressão de seu partido, não deixa.
____________________________________
(*) Publicado originalmente em https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/para-os-petistas-o-governo-lula-esta-em-disputa/ 30/04/2023
Nenhum comentário:
Postar um comentário